A internet já está sofrendo de superpopulação?

Texto restaurado e remixado

Tenho notado que em várias grande corporações, botequins e em casas a expressão “o sistema está lento” anda cada vez mais intensa. Hoje, no meu trabalho, sofremos. Apesar de 15 megas de velocidade contratada, a internet parecia um jabuti de tão lenta, dando pau toda hora.

Vamos lá: a população mundial passou dos sete bilhões de pessoas e a dos internautas está perto dos quatro bilhões. Gente pra cacete! Impossível que esse crescimento avassalador, associado a ganância dos empresários do ramo de telecomunicações (pensam em lucro mil e investimento zero), não esteja congelando a internet.

Divagarei mais alto: como ficaria o mundo se a internet desse um crash? Robert Fripp, compositor, guitarrista, fundador do King Crimson e, sobretudo, gênio, disse, tempos atrás, que “sem a web voltaríamos a idade da pedra porque o mundo avança sem se preocupar com a possibilidade de um retrocesso necessário.” Ou seja, o mundo não tem no break.

Você tem percebido que a sua navegação na internet tem andado mais lenda ultimamente? Tem enfrentado como nunca o tal “sistema lento” quando recorre a um serviço qualquer? Acha que a tecnologia já deveria estar pensando numa solução para o esgotamento total da internet? Ou isso é chuva de inverno, toró de fim de tarde, asneirol vago do articulista aqui?

Vale a pena ler esse texto:

Boom e Saturação na Internet

Antonio Miranda
Doutor em Comunicação
Universidade de Brasília


O volume crescente de páginas na web é verdadeiramente fantástico. Nas mais diversas línguas civilizadas e até mesmo em dialetos desconhecidos. Uma avalanche de textos, fotos, vídeos. De tudo para todo mundo.  

Acompanho o crescimento desde os primórdios da rede mundial de computadores, tendo participado do envio de mensagens (via Gopher) de Washington para o Rio de Janeiro quando os endereços eletrônicos no Brasil contavam-se nos dedos e estavam concentrados no LNCC (Laboratório Nacional de Computação Científica).  

Participando do grupo que redigiu o Programa Sociedade da Informação no Brasil — o chamado LIVRO VERDE, no final do século passado—, defendemos a tese (ou sonho, naqueles tempos) de que deveríamos propiciar formatos de edição para que as pessoas pudessem colocar na rede seus testemunhos, seus poemas, suas experiências de vida, fotos de família, história social viva e corrente. Parecia um delírio. Hoje é o que as pessoas fazem diuturnamente em grupos de discussão, em blogs pessoais, às centenas, aos milhares, aos milhões...  

Na Usina de Letras (www.usinadeletras.com.br) os autores “publicam” crônicas, roteiros, pensamentos, poemas, ensaios e todo tipo de textos, o tempo todo. Vinte e quatro horas por dia, incessantemente. Para alguns é como se fosse um desafio, uma maratona. Lixo? Nem tanto. Os sociólogos, os antropólogos, os politólogos e lingüistas haverão de vasculhar esses filões para entenderem a complexa história dos nossos tempos atuais – o ciberespaço, a posmodernidade. Comportamento, transformações gramaticais, hegemonias culturais, modismos e valores.

Uma questão polêmica que se apresenta no debate sobre a qualificação dos conteúdos na Internet é a de quem opina sobre o quê. Um exemplo: quando a Amazon.com começou a vender livros (nos primórdios do e-commerce), ela apresentava os dados sobre os títulos dos livros e divulgava resenhas de especialistas sobre as obras. Depois descobriu que isso inibia em vez de promover as vendas e passou a publicar as opiniões dos usuários em geral... 

Pode até ser mais democrático mas o comprador entra nas malhas do jogo do marketing, da lógica do bestseller, em que o “melhor” é sempre o mais vendido, o mais popular, como acontece também com as estratégias dos exibidores de tv comercial, cinema e vídeo.(1)

O Google está escaneando e criando uma repertório mundial de nossa literatura de todos os tempos em formato digital. O Gmail está guardando até as mensagens mais triviais que as pessoas enviam e recebem. O privado vira público, há voyeurs cibernéticos —humanos e robotizados. E até a CIA está em busca de indícios de terrorismo em mensagens que circulam planetariamente.

Ter uma página na web era um distintivo, um diferencial. Agora é lugar- comum. Os releases revelavam as oportunidades, as novidades num processo competitivo e dinâmico, que acompanhávamos com certa avidez. A inundação por spans indesejáveis, abusivos, e o excesso de releases de forma indiscriminada parece irritar mais do que surpreender. Eles estão deixando de ser uma forma de promoção, estão tornando-se inconvenientes. Viraram uma praga invasora dos nossos computadores e de nossa privacidade. Daí a adoção de uma nota consultando o interesse das pessoas, dando-lhes a oportunidade de se descadastrarem das mailing lists. Algumas pessoas abusam, mandam dúzias por semana!!!  

Há poucos dias atrás ouvi um comentarista afirmando que, na enxurrada de sítios aparentemente banais, é possível encontrar o que há de melhor, de mais vanguardista, de renovador. Lembro-me do Dr. Donald Urqhart, da British Library Lending Division que, no início da década de 70, difundiu a Teoria do Lixo para dizer que a pesquisa não se faz apenas com o trigo mas também com o joio...  

Ioneji Masuda, há meio século atrás, já previa uma sociedade globalizada e informatizada, voltada para a construção coletiva e solidária do conhecimento. O problema é como selecionar, como vencer e remover o entulho, como diferenciar o melhor do execrável (para nós, mesmo que não seja para outros...). O comentarista deu uma pista animadora: a possibilidade da auto-regulação, a seleção natural... O melhor, segundo ele, acaba sendo adotado e indicado, surgem links orientando de umas páginas para outras, como acontece nas citações bibliográficas. No cipoal, no emaranhado de páginas, haveria uma associação entre elas por uma identificação interpares. 

Ou seja, se você descobre uma página que satisfaz a sua exigência, corresponde as suas expectativas, é provável que ela indique outras páginas do mesmo nível e temática, num entrelaçamento oportuno, dentro do princípio das redes sociais.

Com a televisão aconteceu a mesma coisa, desde os tempos de McLuhan. O aparato das elites converteu-se na máquina de “fazer doido” das maiorias. As pessoas mais exigentes partiram para a TV por assinatura e, com a vulgarização das mídias televisivas de aluguel, estão migrando para canais na Internet. Comparando, dá para prever acessos mais exclusivos na rede, valendo-se de provedores especializados, de softwares para a filtragem, certamente pagos... para evitar pop ups e spans.

Soluções mais efetivas virão. Desde a classificação prévia, passando por categorias e níveis, garantindo certificações e julgamentos prévios (espécie de peer reviews redivivos), com o apoio da infometria, de parametrizações ou formatações prévias ou a posteriori, para orientar os internautas.

O boom espantoso de bancos de dados, portais e vortais, blogs e vlogs, e com a consolidação e expansão de imensos repositórios institucionais em escala mundial, e da proliferação dos open archives, impõe-se uma estratégia de estruturação e uso mais inteligente dos conteúdos na Internet. Webometria, websemântica (2), ontologias, protocolos, arquiteturas... Na babel da web qualquer medida para dar ordem ao caos será bem-vinda.  
*********  
(1) Sítios de vídeo (videoblogs) e de música em MP3 também apelam para o mesmo expediente, na lógica de que “o público tem o que merece”. [Não esquecer de uma declaração, tempos atrás, de um cantor de uma dupla “sertaneja”recordista de audiências que declarou ser melhor que Caetano e Chico porque vendem mais discos do que os dois compositores da MPB juntos, e que esse seria o julgamento do povo. Em sentido contrário, podemos cair na arapuca do “elitismo” na medida em que o popular, pela produção em escala, resulta unitariamente mais barato e viável comercialmente enquanto que o mais “exclusivo” ou de (suposta) melhor qualidade acaba sendo para consumo privilegiado e mais caro. Nos canais aberto de TV os programas com conteúdos mais complexos são programados para os horários mais tardios...  

(2) A propósito de websemântica e dos desdobramentos previsíveis na web anexamos um texto de nosso amigo Aldo Barreto que resenha outro (de André Machado) que vai direto ao assunto:  

ANEXO

Os novos rumos abertos pela web 3  

A WEB 3 baseada na semântica tentará descomplicar a vida do usuário, que hoje precisa separar informações úteis das que só fazem confundir. Nem bem começaram a falar da Web 2.0 e já começa a se formar um novo desenvolvimento: a versão 2 é apenas uma passagem, o que vai valer mesmo será a versão 3.

A Web 2.0 significa “tudo ao mesmo tempo agora” online: sobressaem nela as redes de relacionamentos (“networking”) como Orkut, LinkedIn e Multiply, as plataformas “live” da família Windows e Google, o RSS, o Ajax, os blogs, fotologs, videologs — enfim, o poder cada vez mais nas mãos dos usuários.  

A Web 2.0 é chamada de a internet participativa. E mais participativa ela fica com o crescimento de gadgets móveis com acesso à internet. Além dos que celulares, PDAs que viraram objetos de desejo como o Blackberry, o Nokia E-62 e o Moto Q e transformam a web em rede a tiracolo a reboque do usuário e de padrões de tecnologia móvel de segunda e terceira gerações.  

Estamos apenas no começo. É provável que a internet passe por uma verdadeira revolução nos próximos anos. E uma das maiores chaves para esta revolução em direção à versão 3 está no campo da web semântica. A internet tal como a conhecemos hoje é uma internet sintática, isto é, uma Internet em que os computadores nos mostram a informação, os dados, mas sua interpretação e relacionamento fica a critério dos usuários.  

A idéia da web semântica é que os próprios sistemas sejam capazes de interpretar essa informação. Isso se faria através de uma organização interna da informação na grande rede. O maior problema da internet de hoje é que ela nos oferece toneladas de informação na forma bruta, sem mecanismos que nos ajudem a processá-la.  

Esta nova internet vai ser a revolução industrial da rede.A web semântica, em que os computadores serão capazes de interpretar os dados para simplificando pesquisas e serviços hoje apenas expostos na rede depende de novas tecnologias já em desenvolvimento.  

Basicamente tecnologias de integração e inter-operacionalidade para construir dados sobre outros dados, metadados com orientação semântica trabalhando em conjunto com uma estruturação de conceitos mais explícitos e coordenados, que ajudem o sistema a identificar e achar outros recursos eletrônicos semanticamente relacionados numa rede.



Fonte: mensagem baseada no texto de Andre Machado, Papo-Cabeça, para o Caderno Info, Etc, do Jornal O Globo de 04/12/2006 , versão impressa,  http://www.oglobo.com.br  

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