1973 - Um ano realmente especial para a MPB - texto de Mehane Albuquerque Ribeiro

Lançado há menos de um mês, o livro 1973 – O ano que reinventou a MPB, publicado pela Sonora Editora, já conquistou uma gama expressiva de público e na semana de lançamento esteve entre as 20 obras de não-ficção mais vendidas no país, de acordo com o ranking da revista Veja. O cenário do livro é um Brasil em plena ditadura militar. E o período retratado — o ano de 1973 — veio logo depois da era dos grandes festivais da canção (1965-1972), quando a música brasileira já não estava mais presa à Bossa Nova, à Jovem Guarda, ao Tropicalismo, ou a outro movimento estético. Não havia qualquer expectativa de que algo pudesse ocorrer para trazer novos ares à produção musical. Mas eis que algo extraordinário acontece: despretensiosa e inesperadamente, a música popular brasileira ganha um fôlego extra, com a produção de discos memoráveis que marcaram o período como um dos mais singulares de sua história.

O livro reúne resenhas de cerca de 50 jornalistas, artistas e críticos, sobre 50 discos entre os mais expressivos daquele ano. O responsável pela organização dos textos é o jornalista Célio Albuquerque — pesquisador da MPB e produtor musical — que teve a ideia ao perceber que, embora alguns jornalistas já tivessem sinalizado que 1973 foi realmente um ano ímpar para MPB, isso não estava “formalizado em nenhuma obra publicada”.

O período foi realmente especial na opinião de alguns pesquisadores e críticos, entre eles o jornalista Nelson Motta, que dedicou uma edição inteira de sua coluna no Jornal da Globo para falar do livro, reforçando a tese. Quem viveu não esquece. E mesmo os que sequer haviam nascido àquela altura, hoje se encantam com canções que se imortalizaram, como Cálice, de Chico Buarque e Gilberto Gil, proibida de ser cantada no festival Phono 73, cujo episódio é narrado no livro.

Foi um ano de grandes estreias. Elton Medeiros, Luiz Melodia, Raul Seixas, Fagner, Walter Franco, Gonzaguinha, Francis Hime, Sérgio Sampaio, João Bosco, Lula Côrtes, Lailson, e Marconi Notaro lançaram seus primeiros LPs. Caetano Veloso produziu neste ano o mais experimental de seus discos: Araçá Azul. Odair José estoura nas paradas de sucesso das rádios populares cantando a pílula anticoncepcional. Eumir Deodato consagrou-se como um dos maiores vendedores de discos no mundo, com sua versão para “Zaratustra”, de Strauss. Vinícius e Toquinho ganharam as telas da tevê com a trilha sonora da novela O Bem Amado. E os Secos & Molhados surgiram surpreendendo a cena musical, fazendo o país inteiro rebolar ao som do “Vira”, embalado por músicos seminus, cujo principal vocalista tinha voz feminina e se contorcia no palco feito cobra.

Para dar conta da árdua tarefa de reunir em obra as informações e fatos que pudessem dar ao leitor a real dimensão do que foi o ano musical de 1973, Célio Albuquerque convidou um time de autores de peso para resenhar os discos. As escolhas dos nomes, segundo ele, não foram aleatórias. O jornalista levou em conta, principalmente, a identificação de cada um deles com o título a ser resenhado.

“Quem poderia escrever com mais propriedade sobre o disco do Terço, do que Luiz Antonio Mello, profundo conhecedor do rock brasileiro e internacional? Haveria alguém mais adequado para falar do disco do Gonzaguinha do que Dacio Malta, que escreveu um musical sobre o artista? Quem mais conseguiria tratar com tanta sensibilidade o disco de Paulinho da Viola, do que Moacyr Luz, que é sambista do mesmo naipe? Ou quem falaria de forma mais verdadeira sobre os Secos & Molhados, do que o Emílio Pacheco, que era adolescente na época e coleciona tudo o que se publica sobre o grupo?”, pergunta ele, em tom de afirmação.

O disco de Naná Vasconcelos, coube a outro talentoso percussionista: Marcos Suzano. O de Clara Nunes, foi resenhado por Vagner Fernandes, biógrafo da cantora.  Em alguns casos, os autores convidados são produtores de discos:
Um deles é Tavito, que além de produzir o 1º Acto, do Zé Rodrix, também foi parceiro dele em “Casa no Campo. Para resenhar o disco de Martinho da Vila, o convidado foi Rildo Hora, produtor do mesmo LP. André Agra, incentivador do livro e um grande produtor musical brasileiro, escreveu sobre o disco do Eumir Deodato, um arrasa-quarteirão que vendeu cinco milhões de compactos no mundo inteiro em 1973.

O organizador do livro ressalta que fez questão de ter diferentes gêneros musicais representados na obra — do samba ao rock and roll. “Convidei o jornalista Vicente Datolli para escrever sobre algum disco de samba com o qual ele se identificasse muito, e ele sugeriu o das Escolas de Samba. Foi uma ideia ótima, que aceitei na hora, pois o disco traz enredos que são verdadeiros “clássicos” do gênero”, diz ele.

A seleção dos títulos não foi fácil e Célio teve que deixar a emoção de lado para não ultrapassar a marca dos 50 discos. “O ano de 1973 foi tão fértil e se produziu tanta coisa interessante, que daria, guardadas as proporções, para reunir em um segundo volume os títulos que não puderam ser resenhados neste”, revela.

Por tudo isso, o livro 1973 – O ano que reinventou a MPB já é uma referência para quem pesquisa ou quer conhecer melhor esse período tão marcante na história da nossa música.

Mehane Albuquerque Ribeiro - Itaipu, fevereiro de 2014.


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