Por que o ontem parece melhor do que o hoje?
No momento em que escrevo ouço o bombástico álbum triplo
do Led Zeppelin, “How
the West Was Won” gravado ao vivo em Los Angeles, em 1972, e lançado em 2003. Que soco! Que murro! Que coisa genial, visceral, enfim, por mais que eu ouça mais
distante fico de uma justa definição. São 18 músicas que se esparramam inflamadas no
computador chutando o baixo astral, o pessimismo e afins. O disco (como todos
do Zeppelin) está disponível em www.spotify.com
(estou viciado nesse canal). É só entrar, se cadastrar, baixar o programa e em
menos de três minutos, de graça, estamos dentro de um gigantesco universo musical. Achamos
samba, chorinho, música clássica, jazz, blues, bossa nova, rock. Tem de tudo,
de todos os tempos.
Acabei de ler o livro “As Sete Vidas de Nelson Motta”
que, ao contrário do que imaginei, não é uma autobiografia. Nele, Nelson
reproduz colunas que escreveu na Última Hora (entre 1966 e 1968), Jornal do
Brasil, O Globo e faz algumas reflexões inéditas sobre a vida. Aos 70 anos,
parece um garoto, mas sabe que o tempo passa, vai continuar passando e cai de
chute na nostalgia, que ele detesta.
Volta e meia uma onda saudosista varre nossa história
pessoal. Muita gente, toda hora, posta músicas dos anos 60, 70 e 80 no Facebook,
onde os frequentadores de uma página dedicada a lendária Radio Jornal do Brasil
AM, minha escola de jornalismo, também lembram de momentos que nos foram tão
belos, lúdicos, sensacionais na programação musical da emissora.
Meses atrás fiquei postando anos 70 no Facebook. Bandas
alemães de 70, 71, 72, Deep Purple lançando Machine Head, Jards Macalé cantando
“Farrapo Humano” e por aí fui. Por que? Não sei. Deu vontade.
Na verdade, quando posto canções antigas (não serei
hipócrita) busco o virtual sossego do passado. Que sossego? O sossego comum,
vizinho da calma, da tranquilidade, aquela que aparentemente enxergamos
naqueles pescadores empunhando caniços nos litorais do mundo. O passado é um
ótimo lugar para acharmos o sossego porque, em várias situações, ele surge. E a
música tem o poder de nos transportar através do tempo.
Nas ilhas de edição de vídeo podemos mexer em tudo, dar a
definição que acharmos melhor. É o caso das lembranças. Em geral, lembramos do
que foi bom, do que foi legal, sensacional, porque só um masoquista lembra de
momentos ruins o tempo todo. Como numa ilha de edição, montamos na mente um
vídeo só com os melhores momentos.
Lembro que no tal dia que postei anos 70 no Facebook, me
emocionei com a maciez eletrônica do grupo Neu, depois um pouco de Mike
Oldfield e, é claro, o Tangerine Dream, mesmo hoje, 40 anos depois, nos leva a
lugares sossegados.
Não sei quem inventou o jargão “recordar é viver”,
“saudade não tem idade” e outros. O fato é que a maioria (?) das pessoas
relembra, revê, relê, como se o presente não estivesse robusto o suficiente
para atender as suas demandas pessoais. As pessoas que falam de Beatles, TV
Tupi, Lambretta, trampolim da praia de Icaraí, Torrão de Açucar em Búzios, por
exemplo, são chamadas de saudosistas. Mas e a maioria que sente/pensa o mesmo e
não revela?
Por que o passado ganha do presente? Por que o presente
perde para o futuro? O que há de errado com o aqui e agora? Não sou filósofo,
nem psicólogo social, mas os livros dizem que sempre foi assim. Tem um verso do
Caetano que quando ouvi a primeira vez achei que era uma resposta, mas depois,
ouvindo seguidas vezes, percebi se tratar de uma gigantesca pergunta:”Existirmos/a
que será que se destina?”.
Especulo que o presente nos força a existir. Sim. Soltar
amarras, voar, partir para a urgência, executar. O texto que escrevo agora é
este, não há outro. Mais: pensamos uma coisa de cada vez. Mais: temos o direito
de sentir saudade, sim. De pessoas, tempos, coisas, cidades, mas, recomendam os
mais experientes, não devemos voltar lá. Decepção. Passei minha infância feliz
da vida numa vila militar em Angra dos Reis, onde meu pai serviu como oficial
de Marinha. Voltei lá nos anos 90. A vila está a mesma coisa e, confesso aqui
muito particularmente que até chorei de emoção, mas Angra? Angra virou o maior
favelão, não tem mais o trem onde brincávamos, a praia do Anil está cheia de
urubus e a recepcionista da cidade não é mais uma sabiá-laranjeira e sim uma
usina nuclear.
Alguém escreveu que não devemos voltar onde fomos felizes
e que o lugar do bom passado é num dos arquivos de nossa memória afetiva. Mas,
por que sinto o coração apertar quando ouço “I´m not in Love”, do 10 cc, que
antes de virar sucesso em todas as rádios tocava na não menos saudosa Eldo Pop
FM? Como explicar os 5, 6, 7 e-mails por dia que respondo sobre a Rádio
Fluminense FM que criamos há 30 anos? Pior: a maioria dos leitores não era
nascida quando a rádio existia? Alguém explica?
Um dia desses alguém me disse “saudade é uma coisa,
saudosismo é outra”. Quando encontro amigos da adolescência lembro nitidamente
de cada dia, cada momento, mas esqueço de trazer a tona as angústias, a
reprovação no colégio, a queda de uma onda que me custou 11 pontos na perna.
Por que a nossa mente só edita bons momentos do passado? Por que até pessoas que
se revelaram molecas no presente hoje tem um lugar carinhoso em nossos
escaninhos?
Alguém tem as respostas?
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