Rachuncho
- Bom dia, paz e amor.
- Paz e amor. Senta aí. Tem certeza que isso aqui é
seguro, não tem escutas, drones, arapongas, nada?
- Claro. Uma pocilga insignificante, numa cidade
insignificante, porcos insignificantes.
- Mas que fedor.
- É...
-Fez os cálculos?
- Sim, tudo certinho.
- Mostra aí.
- Você mandou aumentar o rachuncho, eu aumentei para
55%.
- É pouco. Eu disse que tem que ser, no mínimo, 65%
para o rachuncho e 35% para os cofres.
- Muita gente vai gritar.
- Já gritam, me chamam de ladrão... 65% é uma questão
de coerência; não dizem que sou ladrão? Então sou um ladrão de peso, de qualidade,
um ladrão imponente, entendeu?
- E os homens de preto?
- Vão levar o deles. O de sempre. Uns dois ou três
quiseram cantar de galo, mandei a merda. Quem compra tem sempre razão e eu sou
um consumidor de pessoas (risos).
- Está tudo
aqui...certinho...
- Hum.
- Mais duas boladas dessas e o rachuncho começa a ficar
bom.
- 10 bi é pouco.
- Como assim?
- É a minha aposentadoria...no mínimo 15 bi.
- Acho que vai dar tempo...nessa escalada que estamos
indo.
- Já forjou o prejuízo no caixa da X, da Z, da Y e da
T?
- Já. Está tudo no vermelho. Domingo os jornais vão
cair de pau.
- Ótimo. Ótimo. Fundamental eu sair como incompetente
dessa história...
- Mas tem muita gente que desconfia do rachuncho...
- O rachuncho no Brasil desembarcou em 1808 com D. João
Sexto...vão botar a culpa em mim?
- E quanto aos óbitos, mantém nessa escala?
- Sim. Nem muito, nem pouco... aumenta um pouco o de crianças para mostrar a "crise", mas a média está boa. E aquele
cientistazinho que apareceu com aquela vacina?
- Subiu...coitado, bateu com o carro numa serra...carro
pegou fogo, foi carbonizado com a família...coitado.
- Ninguém desconfiou?
- Não...tranquilo. Tudo tranquilo.
-A cota esse mês bateu. Mês que vem quero pelo menos
15% a mais, sempre na mesma proporção: 65% para o rachuncho, 35% para os
cofres. Não abro mão...não me chamam de ladrão? Então toma! Já orçou o julgamento?
- Tudo OK, até que ficou baratinho. Um bi.
- Hum. Bom...muito bom. E como está o cofre?
- Quase zerado...
- Bom, muito bom...trouxe o uísque?
- Sim, está aqui, rótulo preto, 20 anos.
- Um brinde ao rachuncho...
- Rachuncho, sempre!
- Por todos os tempos.
- Tim, tim.
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