O estagiário e o trainee de jornalismo

Está chovendo erro de concordância, falhas de apuração, matéria sem início (tentam romancear mal e porcamente) e ignorância quase geral. Por isso, antes de apedrejar é bom lembrar que o estagiário e o trainee de jornalismo são aprendizes. Em tese, sim. Desde sempre e não somente quando foi inventado o curso superior de Comunicação Social no Brasil, em 1969.

Hoje, não há mais obrigatoriedade de diploma para que qualquer um vire o jornalista. A coisa voltou aos tempos pré-1969, mas a maioria das empresas exige que candidatos a estágio ou treinamento avançado estejam cursando uma faculdade.

Fato é que nos protocolos, na papelada, na teoria está tudo muito bonitinho mas, na realidade, estagiários e trainees viraram mão de obra barata, burros sem rabo que como paus de enchente zanzam de um lado e para o outro, perdidos nas redações da vida. Começam, então, a cometer jornalismo do jeito que ensinam, ou seja, nas coxas.

A ignorância é um direito. Estudante ignorante é mais do que aceitável. Como o nome já diz ele ainda está estudando, aprendendo. Em tese, estagiários e trainees estão no mercado para errar. Errar, aprender e ser submetidos a rigorosa supervisão. Depois de serem exaustivamente treinados aí sim podem publicar suas primeiras matérias. No caso do jornalismo, a vivência, o dia a dia, a estrada, a experiência fazem a diferença.

Ninguém ensina um sujeito a: 1 – ser curioso; 2 – ser esperto; 3 – ser bom caráter; 4 – ser vibrante; 5 – ser humilde; 6 – ser solidário; 7 – ser equilibrado; 8 – ser inspirado; 9 – ser criativo; 10 – ser jornalista.

Hoje, muitas redações estão sob o comando de aprendizes comprometendo muitíssimo a qualidade da comunicação. O que lemos, ouvimos e assistimos de erros boçais por aí chega as raias do absurdo.

Um estagiário ou trainee no comando de uma redação (seja ela qual for) é como substituir Ruy Barbosa por um estudante de Direto num tribunal. Não é apenas temerário. É absurdo. Mídia lida com vidas, com gente, com instituições, poderes, governos. Mídia exige calo nas mãos para falar e papas na língua para escrever, assim mesmo nessa ordem. Mídia exige ética. Ética que aprendemos ao longo da vida, muitas vezes através de falhas lamentáveis que testemunhamos nas redações e que nos levam a pensar “por esse caminho não irei”.

Leio/ouço/assisto calamidades de gente que conhece a boa literatura de ouvir falar e usa a internet como Juízo Final. Em vez de mera referência o Google virou fonte, verdade absoluta para muita gente. 

Quando dou entrevistas (principalmente por telefone) fico apavorado porque, em algumas ocasiões, senti que do outro lado da linha o futuro colega não sabia quem sou, o que faço, o que fiz e só conhecia o motivo da entrevista meio que por acaso. Mandaram ele ligar e...e...e...


Dizem que esse quadro reflete a realidade deste novo e lamentável Brasil. Não sei, estou farto de teorias. Estagiários e trainees tem que voltar a condição de aprendizes, antes que as mídias sejam despejadas, definitivamente, na vala comum do desprezo, do esquecimento, da falência.

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